Ô da poltrona, aumente o volume aí porque os trapalhões estão de volta...
Ô da poltrona, ei psit, é o seguinte, não sei vocês, mas a minha infância foi marcada pelas estripulias dos Trapalhões, o nosso
fab four
do humor. Tive a honra de pegar parte da melhor fase do grupo que
durante muito tempo reinou na nossa televisão e no cinema como os
monarcas absolutos da comédia no Brasil. E olha que não era tarefa
fácil, tendo em vista contemporâneos do
métier como Jô Soares e Chico Anysio, esse último, em minha humilde opinião, o maior comediante do mundo.
Já os trapalhões, formado pelo “amarelinho” Didi (Renato Aragão), o
cabeça do grupo, Dedé Santana, o metido a galã, Mussum, o autêntico
malandro da Mangueira e Zacarias, o mineirinho com alma de criança, por
meio de suas origens diferentes e tipos engraçados que criaram,
representavam a essência do povo brasileiro.
Com o humor simples, direto e popular que formataram ao longo de mais
de uma década, eles se transformaram no quarteto mais querido e
engraçado do país, capaz de lotar 100 “Maracanãs”, numa única noite de
domingo, com mais de 20 milhões de espectadores estáticos diante da
televisão.
“As pessoas compram essa lição secreta do mundo mágico dos trapalhões
como aplaudem os desejos felizes que Aragão imagina em seus filmes”,
narra Chico Anysio, no documentário O mundo mágico dos trapalhões, produção de 1980, realizada por Silvio Tendler.
Na ingênua mistura de malabarismo circense, comédia pastelão e teatro
de variedade, com o humor espalhafatoso dos irmãos Marx e o lirismo
tocante do universo de Charles Chaplin, um dos ídolos de Renato Aragão,
eles conquistaram não só a garotada, mas os pais dela também. Uma
tradição que passa de pai para filho, graças aos DVDs que hoje trazem
não apenas os melhores momentos do quarteto na televisão, mas no cinema
também.
Basta lembrar que nos anos 70, entre os 20 filmes de maior bilheteria
do cinema nacional, oito eram dos trapalhões, que na maioria das vezes
conseguiam desbancar até mesmo as produções hollywoodianas. Era uma
época em que o povo brasileiro ria em português. Ou seja, o sucesso de Tropa de elite não é novidade.
Volta e meia, quando o tédio aperta e o sono não chega, eu e minha
afilhada tiramos um dos filmes do Didi e sua turma da nossa estante
mágica, dando espaço ao sonho, à magia e a gargalhada fácil. É isso a
“cacildis!”.
Os meus cincos filmes preferidos dos trapalhões:
Os quatro juntos fizerm mais de 20 filmes, atigindo um público de
aproximadamente 10o milhões de pessoas. Alguns desses títulos perfilam
entre as maiores bilheterias do cinema nacional. Abaixo o meu top five
dos Beatles da nossa comédia.
Didi
encarna o malandro João Grilo, na clássico obra de Ariano Suassuna.
Segundo o autor, esse filme foi a melhor adaptação de sua obra
Os trapalhões no auto da Compadecida
Uma vez, entrevistando o grande escritor e dramaturgo Ariano
Suassuna, em Brasília, não resisti e perguntei o que ele achava das
adaptações de sua obra máxima para o cinema e televisão. E ele, com sua
sinceridade obtusa, não pestanejou:
- Gosto de todas, mas a melhor que já fizeram foi a com os trapalhões.
Quase caí das nuvens.
Dirigido em 1987 por Roberto Farias, o filme é uma obra-prima na
carreira do cineasta (irmão de Reginaldo Farias), e da trajetória do
grupo. Curiosamente, seria um divisor de águas também, porque a partir
desse projeto, a qualidade de seus filmes degringolaria
vertiginosamente.
No elenco, nomes de peso como Raul Cortês e Cláudia Jimenez, mas quem
rouba a cena é Didi, perfeito na pele do malando João Grilo, o amarelo
mais safado que se tem notícia. Junto com Dedé seu eterno comparsa, aqui
como Chicó, eles irão desafiar e escancarar a hipocrisia que ronda a
Igreja e os donos do poder.
Zacarias encarnaria o padeiro traído e Mussum, esbanjando
dramaticidade em atuação soberba, dando voz a ninguém menos que Jesus.
Bem queimadinho, é bem verdade, como observaria João Grilo, mas mesmo
assim o filho de Deus.
A segunda parte do filme é lirismo puro. (Visto por 2.610.371 pessoas)
O trapalhão nas Minas do Rei Salomão
Filmado em 1977, no auge da carreira, o filme, que ainda não contaria
com o baixinho Zacarias, seria a maior bilheteria da história do grupo
no cinema, com quase seis milhões de expectadores. Parte do sucesso se
deve ao fato de que, naquele ano, eles estreavam na Globo, então, a
maior
Mussum e Wilson Grey, numa das cenas de O trapalhão nas Minas do rei Salomão
emissora do país. Não sei você, mas eu perdi a conta de quantas vezes assisti à fita na Sessão da Tarde, morrendo de medo daquela bruxa pavorosa, que parece ter sido tirada de O mágico de Oz.
O final é apoteótico, com cabanas pegando fogo, uma cena antológica do
Didi pilotando um enorme trator e momento melancólico, com nosso herói
chorando a morte de seu melhor amigo, o cãozinho Totó. (Visto por 5.786.226 de pessoas)
O rei e os trapalhões
O prestígio do grupo era tamanho que eles filmaram parte dessa
produção de 1979 no Marrocos, a fim de dar maior realidade à história de
quatro ladrões que, por acaso, são contratados para salvar o rei das
mãos de vilão inescrupuloso. Uma releitura bem atrapalhada de uma das
tramas do clássico As mil e uma noite, o enredo brinca com os
principais signos da cultura árabe e traz tudo, a lâmpada mágica e o seu
Gênio, beduínos irados no deserto, odaliscas e princesas angelicais e
“miragens” deslumbrantes.
A última parte do filme dirigido por Adriano Stuart é uma crônica
social corrosiva, bem ao estilo do grupo, às mazelas do país, ainda sob a
égide do regime militar. (Visto por 4.240.757)
Os saltimbancos trapalhões
Realizado em 1981, é de longe o trabalho mais esmerado do quarteto, e
desde o início Renato Aragão se empenhou que realmente fosse. “Queria
fazer o melhor filme da minha carreira”, disse na época do lançamento.
Dirigido por J.B. Tanko, o diretor da Atlântida que seria recrutado pela
turma anos depois para trabalhar em seus projetos nos anos 70, Os saltimbancos trapalhões é tido pela crítica o melhor filme dos trapalhões.
A história gira em torno de um grupo de artistas circenses simplórios
que ganha simpatia da plateia depois de uma apresentação surpresa cheia
de erros e acertos no picadeiro. Uma vez enfronhados na rotina de
trabalho e no meio dos artistas, eles descobrem que o patrão e alguns
funcionários da casa estão envolvidos em corrupção. Entre confusões e
muita atrapalhada eles tiram todo mundo do sufoco, salvado a imagem do
circo.
Com os saltimbancos trapalhões Renato Aragão quis realizar seu melhor filme
Com trilha sonora assinada por ninguém menos do que Chico Buarque, a
produção, que quase chegou a ser dirigida por Cacá Diegues e Nelson
Pereira dos Santos, teve algumas cenas rodadas nos estúdios da
Universal, em Hollywood, e a atriz Lucinha Lins como a mocinha da trama.
O desfecho chaplineano, com Didi sozinho no meio do picadeiro ao lado
da inseparável fantasia, que chora, é inesquecível. (Visto por 5.218.574)
Os trapalhões e o mágico de Oróz
Com certeza não é o melhor filme dos trapalhões, mas adoro por conta
da brincadeira, bem ao estilo brasileiro, que eles fazem em cima de um
dos clássicos do cinema norte-americano. Acho inclusive, infinitamente
melhor do que a adaptação da Motown, de 1978, com Michael Jackson como espantalho.
Quem acompanha a trupe sabe que suas adaptações para o cinema eram
meros decalques, paródias e releituras histriônicas de clássicos da
literatura e do cinema como O trapalhão no planalto dos macacos (1976), Os trapalhões na guerra dos Planetas (1978), O Cinderelo trapalhão (1979) e O cangaceiro trapalhão (1983).
O enredo tem uma pegada bastante social, focada no drama da seca no
Nordeste e com os personagens e roteiro costurados dentro desse
contexto. Não é uma obra-prima, mas essencialmente honesto. (Visto por 2.465.899)
* Este texto foi escrito ao som de: Caetano Veloso (Caetano Veloso – 1967)
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Publicado Originalmente em:
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